sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Genética no canto


Homozigotia em relação ao factor “canto”.
Partiremos da premissa de que existe uma diferença entre o que acontece, por exemplo, com o canto e com determinados factores (lipocromo amarelo, branco dominante, etc.) que afectam a cor da plumagem. Estes são regulados por um ou poucos genes, sofrem uma influência pequena ou nula do meio-ambiente (hereditariedade mendeliana), e cujas leis de transmissão são simples e perfeitamente conhecidas pelos que se dedicam à criação de canários de cor. Contrariamente, no que se refere à transmissão genética do factor “canto”, encontramos a implicação de um grande número de genes, cada um dos quais contribui cumulativamente para o fenótipo, aos quais, por sua vez, se junta uma grande influência do meio ambiente (hereditariedade poligénica).
Portanto, torna-se muito mais difícil ao canaricultor cultivador de raças de canto prever, com base nas leis de transmissão genética, a possível descendência de um determinado casal.
Posto assim o problema, que recurso resta ao canaricultor para conseguir fixar determinadas características referentes ao canto? A resposta a esta pergunta é a seguinte: observação. Observação dos exemplares e da sua descendência para, de um modo empírico, determinar o seu grau de homozigotia, no que se refere ao canto.
Convém, antes de continuar a exposição, clarificar que um canário será tanto mais homozigótico quanto ao canto, quanto maior for o grau de correspondência entre o seu fenótipo (o canto que emite e que percebemos acusticamente) e o seu genótipo (o canto de que é portador no seu estado latente, nos seus genes, susceptível de ser transmitido à sua prole, que será sempre, no mínimo, igual ou maior que o canto que percebemos). Pelo contrário, será tanto mais heterozigótico quanto menor for o grau de correspondência entre o seu genótipo e o seu fenótipo.


Feito este esclarecimento, e relacionando-o com o que vínhamos expondo, é importante dizer que teremos de aplicar a nossa observação, para apreciar o grau de homozigotia que apresentam os nossos exemplares. E perguntarão: E como podemos saber se um determinado exemplar, com o qual pretendemos estabelecer uma determinada linhagem, é homozigótico ou não, no que se refere ao canto? Procura-se dar resposta a esta pergunta expondo um método de trabalho que nos parece útil para a consecução do objectivo, ou seja, determinar se o exemplar com que iniciámos a nossa linha de canto é ou não homozigótico.
Consideremos um determinado macho a que chamamos “A” (rico, por exemplo, em floreados e giros descontínuos) que cruzamos com três fêmeas do nosso aviário, a que chamamos B, C e D. Destes cruzamentos obteremos fêmeas e machos “AB”, ”AC” e “AD” que terão 50% de genes do macho “A”.
Assim, iremos observar os machos “AB”, “AC” y “AD” e aqueles com melhor canto vão indicar-nos que fêmeas deveremos usar, na temporada seguinte, para conseguir os nossos propósitos. Assim, iremos cruzar o pai com as irmãs daqueles canários que melhor cantam (nesta primeira geração, os machos que viermos a obter, pelo seu elevado grau de heterozigotia, fruto do cruzamento do seu pai com as suas mães, limitar-se-ão unicamente a emitir alguns giros do pai, com o qual apenas existirão parecenças remotas. No entanto, uns terão obtido da mãe melhores genes para o canto, o mesmo acontecendo às suas irmãs, daí o interesse em usar as irmãs dos melhores cantores no acasalamento, isto é, por serem também filhas daquela mãe).
Prosseguindo, suponhamos que as fêmeas “AC” e “AD” têm irmãos com belos floreados, e as fêmeas “AB”, por outro lado, não apresentam essa característica. Claramente, na presente temporada, cruzaremos o macho “A” com as filhas “AC” e “AD”. Deste cruzamento obteremos machos e fêmeas “AAC” e “AAD” que terão 75% de genes do macho “A”. Na seguinte temporada faremos tal como anteriormente, de tal forma que do cruzamento do macho “A” com suas netas “AAC e/ou AAD obteremos machos e fêmeas “AAAC” e “AAAD”, que terão 87,5% dos genes do macho “A”.
Chegados a este ponto, terminámos o nosso trabalho e os resultados obtidos indicar-nos-ão o seguinte: Se os machos “AAAC” e/ou “AAAD” têm um canto muito parecido com o do macho “A”, isto significa que o macho A era homozigótico quanto ao canto, isto é, o seu fenótipo era uma cópia fiel do seu genótipo e, além disso, por definição, ao levar um elevadíssimo número de genes do macho “A”, os machos “AAAC” e”AAAD” também serão homozigóticos no que se refere ao canto, e portanto transmitirão fielmente as suas qualidades canoras à sua prole.
Se, além disso, tivermos sido hábeis durante todo este processo e tivermos indo reservando as fêmeas “AC e “AD” (denominadas de sangue médio) e posteriormente tivermos encetado cruzamentos seguindo as tabelas de Felch, então criámos uma linha própria partindo de um macho “A”, linha essa cujos exemplares possuirão um alto grau de homozigotia no que se refere ao canto. Se, pelo contrário os machos “AAAC” e”AAAD” finalmente não apresentarem um canto parecido com o do pai “A”, será sinal de que este era heterozigótico quanto ao canto, pelo que não será muito útil usá-lo para o início de uma linha de canto própria baseada nos giros do dito exemplar.
Por fim, gostaria de dizer que este documento foi redigido com a finalidade de compartilhar conhecimentos com todos aqueles novos aficcionados ávidos de receber informação, uma vez que entendo que o exposto em si mesmo, pouca ou nenhuma informação nova pode levar aos canaricultores mais experimentados.
Para todos os que dedicam tempo a este maravilhoso passatempo, uma saudação cordial e afectuosa.

Leandro Anselmo
Pedro Boavida

Sem comentários: